FARGAS, Joaquín. Princípio Estocástico: Espaço/Tempo/Probabilidade, 2012.
A palavra letramento surge como um desafio no processo de apreensão e significação do conhecimento: não basta entender e repetir aquilo que já se estabeleceu e se consolidou, é essencial que o conjunto do que foi apreendido possa qualificar a ação do indivíduo. Deste modo, letrar-se significa empreender uma forma diferente de atuação, utilizando aquilo que foi apreendido e que, assim, ganha significação.
No
que tange aos modos atuais de relação do indivíduo com o mundo, com as coisas e
pessoas e, por conseguinte com o conhecimento, efetuados pelo aparato
tecnológico informacional e comunicacional, entendo que existem dois
letramentos necessários. O primeiro diz respeito ao acesso ao aparato e a
adequação de seu uso. O segundo, ao meu modo de pensar, mais interessante e
urgente, surge da reflexão sobre a tecnologia em nosso tempo. Sem querer
colocar-me, como no dizer de Umberto Eco, de modo apocalíptico, precisamos
refletir sobre como a tecnologia
1) se torna fascinação e como esta reverbera o mito
de Narciso: “O que importa nesse mito (Narciso) é o fato de que os homens logo
se tornam fascinados por qualquer extensão de si mesmos em qualquer material
que não seja o deles próprios.” (MacLuhan, 2001, p. 59)
2) promove o fechamento ou deslocamento de
percepções: “É a contínua adoção de nossa própria tecnologia no uso diário que
nos coloca no papel de Narciso da consciência e do adormecimento subliminar em
relação à imagem de nós mesmos.” (MacLuhan, 2001, p. 64)
3) proporciona um envolvimento sinestésico, mas não
especializado, que chama atenção para o meio e não para o conteúdo do meio,
pois “o próprio meio é a mensagem” e conforma o que deve ser pensado e
vivenciado, se relacionando com “o mundo num estado de espirito antitético à cultura
letrada” (MacLuhan, 2001, p. 376)
Em virtude deste pensamento, um educador letrado
digitalmente será aquele capaz não só de empregar as ferramentas, os recursos e
os instrumentos em suas potencialidades, mas de adentrar a opacidade do aparato
tecnológico e, munido de criticidade, refletir sobre as novas conformações do
estado de ser e estar no mundo, visando um modo de pensar e atuar não alienado,
mas autêntico.
A construção e/ou significação de saberes atualmente
inclui uma conformação que se pode encontrar no hipertexto proporcionado pela
tecnologia digital informacional, uma “característica multidimensional, dinâmica,
esta capacidade de adaptação fina às situações que os tornam para além da
escrita estática e linear.” (Lévy, 1993, p. 39). Similarmente, o aprendizado de
qualquer conteúdo deve se estabelecer assim: dinamicamente associado a outros saberes,
criando uma rede de conexões entre as diversas áreas de atuação humana.
O que na realidade consiste numa prática
pedagógica de excelência não é o uso deste ou daquele recurso em específico,
mas o quanto os recursos possam promover autonomia e criticidade ao indivíduo. O
que se quer aqui dizer é que se de alguma forma o aparato tecnológico se torna
modo e recurso para a construção dessa autonomia e dessa criticidade ele é bem
vindo. O uso das ferramentas e recursos tecnológicos será ainda mais promissor se
em nossa prática pedagógica retroalimentam uma ação de criticidade sobre o uso
diário da tecnologia e sobre a necessidade de entendimento da natureza das
relações conformadas nesse uso, incluindo-se o mundo do conhecimento.
Sobre se me considero um educador letrado digitalmente, devo dizer que
daquilo que compete ao conhecimento de cada ferramenta em específico sou um verdadeiro
desastre. Conheço muito das potencialidades das ferramentas pelo estudo do uso da
tecnologia na arte e, em virtude disso, estudo as relações advindas das
potencialidades do uso do aparato tecnológico. Reconheço, no entanto, que meu
campo de estudo é mais teórico e crítico.
Ótimas referências Cris!
ResponderExcluirEsqueci as referências bibliográficas:
ResponderExcluirMARSHALL, McLuhan. Os meios de comunicação como extensões do homem, 18ª edição. São Paulo: Cultrix, 2001.
LÉVY, Pierre. As Tecnologias da inteligência. São Paulo: 34, 1993.